A economia brasileira afundou tanto que muitos especialistas disseram que atingimos o fundo do poço. O lado bom da história é que, além de o país parar de piorar, sinais de recuperação já são notados por analistas do mercado. O discurso predominante é de que o segundo semestre será um pouco melhor do que o primeiro, mas a recuperação efetiva — e lenta — terá início no próximo ano. É uma luz no fim do túnel, pelo menos.
A pesquisadora Cecília Rutkoski Hoff, que atua no Centro de Estudos Econômicos e Sociais da Fundação de Economia e Estatística (FEE), faz projeções afirmativas. “Quando se compara os dados dos últimos meses contra os meses imediatamente anteriores, nota-se que a economia já está se estabilizando. Porém, como a recessão foi muito forte, nas comparações anuais ainda observamos quedas, embora cada vez menores.”
Neste segundo semestre haverá discreta recuperação, diz ela. Para 2017, a perspectiva dela é crescimento de 1% a 2%. Tiago Dias Farias, professor na Unisc de Montenegro, pensa na mesma linha: “O nível de desconfiança dos empresários vem diminuindo e a economia começa dar sinais que vai melhorar”.
Para Cecília, a produção industrial mostrou leve retomada nos últimos meses, situação também observada nas exportações de manufaturas. “Há indícios de que o longo ciclo de ajuste de estoques na indústria tenha chegado ao fim, o que está em linha com o pequeno crescimento já observado.”
O fato de a política nacional ter saído da turbulência colabora para a estabilização do cenário. “Passamos por um período de muitas instabilidades políticas e isto, infelizmente, se refletiu na economia. Como a instabilidade política vem diminuindo, automaticamente a confiança do empresário aumenta”, observa o professor da Unisc.
O Fundo Monetário Internacional (FMI) também está menos pessimista com o Brasil. O organismo calculava que o Produto Interno Bruto (PIB) recuaria 3,8% este ano, mas o percentual foi revisto para 3,3% no mês passado. Outro fator é a inflação. Até abril, o IPCA, que mede o índice oficial no País, estava em torno de 10% no acumulado dos últimos 12 meses, mas a expectativa caiu para 7% em 2016, de acordo com projeções do Santander.
O fator Dilma Rousseff
Nos bastidores políticos, o afastamento definitivo da presidente Dilma Rousseff é dado como irreversível. Analistas dizem que a medida é bem-vista pelo mercado. A tese é de que a saída da petista traria um ambiente mais favorável aos negócios. “Isso pode contribuir para a recuperação caso induza uma ‘melhora na confiança’ nos mercados financeiros e uma apreciação cambial mais intensa, o que permitiria a convergência mais rápida da inflação para a meta”, analisa Cecília Rutkoski Hoff, da FEE.
A questão política, no entendimento de Tiago Dias, precisa ser superada. “Como um empresário vai realizar investimento em uma nova planta industrial, por exemplo, se não sabe nem ao menos quem será o presidente amanhã?”, questiona.
As brigas neste campo, diz ele, fazem muito mal à nação. “Por muito tempo nossos políticos ficaram brigando pelo poder e se esqueceram de tomar as medidas necessárias para alavancar a economia. A partir do momento que os eleitos focarem seu trabalho em formas de melhorar o Brasil, as coisas vão voltar à normalidade e voltaremos a crescer.”
O consultor financeiro Marcelo Ferzola, da MFF Consultoria, afirma que o mercado nem cogita o retorno de Dilma. “Agora a expectativa é que medidas impopulares possam ser implementadas pelo governo. Todas visando o equilíbrio fiscal da União e dos Estados, que estão muito endividados.”
A melhora da confiança, acrescenta Cecília, também tem influência do cenário externo, que evoluiu bastante nos últimos meses devido à perspectiva de redução do ritmo de elevação dos juros americanos, aumentos da liquidez mundial e dos preços das commodities, afora a estabilização do crescimento chinês. “Me parece que o afastamento da presidente, sozinho, não teria tanto impacto caso o cenário externo fosse adverso. Em conjunto, os dois movimentos se reforçam.”
O comportamento do PIB
Principal termômetro da economia de um país, o Produto Interno Bruto (PIB) permanece negativo, mas a queda neste ano deve ser menor do que em 2015, ou seja, a situação está mesmo despiorando. “A expectativa para a média deste ano é uma queda de 3%, enquanto no ano passado a redução foi de 3,9%. Isso já marcaria o fim da recessão, apesar do resultado ainda negativo no fechamento do ano”, comenta Cecília Rutkoski Hoff, pesquisadora da FEE.
Na visão de Marcelo Ferzola, o que se percebe até agora é que o PIB vai fechar o ano negativo e, em 2017, não deve haver crescimento substancial — um sinal de lenta recuperação. “Vai aumentar, no máximo, 1%”, antevê. Para Tiago Dias, o índice de riqueza deve “diminuir o nível de queda neste ano, mas o crescimento virá apenas em 2017”.
Com relação à inflação, ele pondera que o percentual segue alto, mas com sinal de recuo. “A previsão é de 7,31% no ano e está atualmente 8,74% nos últimos 12 meses, ou seja, há previsão de melhora, apesar de estar ainda acima do teto da meta de 6,5%”, enumera Ferzola.
De acordo com Cecília, é preciso afugentar o “dragão” do Brasil. “Com a inflação sob controle, os juros poderiam ser reduzidos com mais intensidade entre o final de 2016 e ao longo de 2017, melhorando as condições de crédito e de demanda e reforçando a recuperação – ao custo, possivelmente, de um desestímulo às exportações, que mal começaram a sua recuperação”, constata.
Saiba mais
— A economista Cecília Rutkoski Hoff adverte que o ritmo de recuperação a partir de agora tende a ser lento. O desemprego está elevado, a renda real das famílias está em queda e o crédito segue contido. “Ao que tudo indica, o nível de produção de 2014, pré-crise, não será retomado com facilidade”, projeta.
— O consultor Marcelo Ferzola pondera que as empresas, de uma maneira geral, estão endividadas, com faturamento em baixa e restrição de créditos. “Isso significa que no curto prazo não há recurso e capacidade de investimento viabilizando uma retomada de crescimento mais imediata.”
— Um cenário econômico é composto por algumas variáveis tangíveis que medem o desempenho de setores como o comércio e a indústria, o desemprego, a inflação, e também expectativas reveladas em pesquisas que medem a confiança dos empresários e até dos consumidores. O que contribuiu para as projeções ficarem menos negativas foram as expectativas que mudaram nos últimos dois meses, e alguns indicadores, como a inflação.
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