Incluída no projeto de extinção de fundações encaminhado pelo governo estadual à Assembleia Legislativa, a Fundação de Economia e Estatística Siegfried Emanuel Heuser (FEE) defende que ajuda mais na economia de recursos permanecendo ativa do que sendo fechada. O impacto financeiro da extinção não é pacífico – o Executivo fala em torno de R$ 29 milhões anuais, enquanto a fundação alega que seria de R$ 18,4 milhões. Os pesquisadores defendem, porém, que geram resultados muito maiores ao governo direcionando os investimentos públicos e viabilizando os privados.
“Extinguir a FEE significa passar a gastar mal o pouco recurso que se tem. É um contrassenso: em um momento de crise, em que o Estado mais precisa da FEE, ela pode ser extinta”, comenta o diretor técnico da fundação, Martinho Lazzari. É com base em cálculos e estimativas feitos pela FEE, por exemplo, que o Estado determina a necessidade por município de vagas em creches, taxa de matrículas nas escolas e equipes do Programa Infância Melhor (PIM). “Sem esse dado confiável, ou se gastaria mais do que deveria, ou se gastaria menos deixando as crianças desamparadas”, analisa o economista e servidor Bruno Breyer Caldas.
O argumento do governo de que continuará os estudos com os 52 servidores estáveis em um departamento a ser criado na nova pasta de Planejamento, Governança e Gestão é uma das principais críticas dos servidores. O motivo é que, dos 52, 24 já estão inativos, enquanto os 28 restantes, que não são todos pesquisadores, também já têm condições de se aposentar. “A demissão dos celetistas significa o fim dos trabalhos da FEE”, rebate Lazzari. O fato de deixar de ser autônoma, passando a responder a uma secretaria política, também é visto como uma ameaça. O diretor exemplifica com o caso da Argentina nos últimos anos, onde o órgão estatístico sofreu interferências do governo.
“Na prática, ele passou a não servir mais para nada, porque ninguém mais acreditava nos dados”, cita Lazzari, lembrando que, em todo o mundo, os órgãos têm autonomia para que os dados sejam críveis – inclusive na esfera nacional, com o IBGE, e em boa parte dos outros estados brasileiros. A falta de credibilidade, na visão dos servidores, traria uma série de empecilhos. Um dos exemplos é a partilha dos recursos do ICMS, que é feita diretamente em cima da estimativa populacional calculada historicamente pela FEE.
“O governo não sabe o peso político que isso tem”, argumenta Caldas. Sem a fundação, pode-se abrir brechas para manipulação dos dados favoráveis a uma prefeitura ou outra, além de contestações judiciais dos municípios que discordarem do cálculo. Isso não acontece hoje, segundo os servidores, pelo caráter estritamente técnico da FEE. Entre os 178 servidores da fundação, nenhum é indicado pelo governo ou é Cargo em Comissão (CC). Historicamente, há apenas um CC na entidade, que é o presidente, posição vaga desde julho, mas que na semana passada foi ocupada pelo secretário do Planejamento, José Oltramari. Caldas lembra que a fundação mantém um plano de carreira que avalia anualmente os pesquisadores e concede promoções por mérito.
O tempo médio para se chegar ao topo da carreira é de 43 anos de serviço. “A FEE não é uma instituição arcaica”, defende o servidor. Lazzari ainda afirma que a fundação já se antecipou à necessidade de ajuste fiscal, reformulandose a partir de 2010. Desde lá, o quadro, que chegou a ter 248 servidores, foi reduzido. “Em termos reais, o orçamento caiu pela metade nesses últimos seis anos”, garante. Segundo os servidores, a participação da FEE no orçamento do Estado caiu de 0,13% para 0,06% nesse tempo.
Governo pretende contratar externamente os estudos econômicos realizados pelo órgão
Aprovando-se a extinção da FEE, o objetivo do governo é buscar em outras entidades os estudos hoje feitos pela fundação. “O que não conseguirmos fazer internamente, contrataremos institutos para fazer”, afirma o secretário-geral de governo, Carlos Búrigo. O titular argumenta que há personagens com credibilidade para fazer os serviços, citando universidades. “Tenho certeza de que fazemos todos os estudos com um custo menor”, argumenta Búrigo, que diz não ser necessária uma estrutura estadual “tão cara” para isso.
O secretário ainda argumenta que apenas 10% das horas de trabalho dos pesquisadores são dedicadas aos estudos fixos, aqueles feitos com regularidade. Os servidores rebatem a informação dizendo que estes estudos, como o PIB, exportações, Idese, PED, entre outros, consomem 52% da carga horária. O restante é destinado a assessorias às secretarias e estudos setoriais. O servidor Bruno Breyer Caldas cita ainda que, mesmo quando o governo contrata consultorias externas, a FEE acaba sendo envolvida.
O economista exemplifica com o caso do Zoneamento Ecológico-Econômico, contratado pela Secretaria do Ambiente (Sema), em que a consultoria vencedora solicitou ajuda da entidade para definir a metodologia do estudo. “Sem nossa base de dados e nossas análises, as próprias consultorias terão dificuldades em dar consultoria para o governo e iniciativa privada”, comenta Caldas. O próprio Executivo, continua o servidor, usou dados da FEE para justificar os seus projetos de ajuste fiscal. Os servidores rebatem também a afirmação de que é possível gastar menos externamente. Tendo como exemplo o projeto Recupera+ R$, solicitado pela ProcuradoriaGeral do Estado (PGE) para nortear a cobrança da dívida ativa gaúcha, o custo/hora do projeto foi de R$ 194,00.
O preço de referência desse serviço no mercado é de R$ 328,00. “Tem que se levar em conta, ainda, que o preço que a consultoria cobra existindo a FEE é um. Sem nossos dados e sem a ‘concorrência’ da FEE, será muito mais caro”, argumenta Caldas. O diretor técnico da FEE, Martinho Lazzari, também defende a agilidade da fundação em casos urgentes, já que não exige licitação. Caldas acrescenta que, se cobrasse pelos seus serviços, a FEE daria lucro, mas que não o faz, porque não é esse o objetivo da sua existência. Haveria, na visão dos servidores, dificuldade até em se fazer as licitações, já que hoje é a própria FEE que auxilia a confecção de vários editais das pastas. “Se um dia extinguirem a FEE, terão que recriá-la em seguida”, projeta Lazzari.
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